Numa daquelas conversas de esplanada, das que existem na bonita Marina de Lagos, dizia o meu interlocutor: “Acreditar que estamos sozinhos no Cosmos é uma enorme arrogância, para não dizer uma perfeita estupidez. Basta considerar a multiplicidade dos mundos e o número quase infinito de astros que compõem o Universo para percebermos logo como são imensas as probabilidades, estatisticamente falando, de existir vida extraterrestre."
Perguntei-lhe acerca dos dados
usados nessas estatísticas e respondeu-me que bastava a imensidão do Universo como
dado elementar. Eu retorqui que tamanha e inegável imensidão só provara, até ao
momento, exactamente o contrário. Só conhecemos um caso, o planeta Terra; e
apenas com um exemplo é inviável estabelecer quaisquer estimativas
estatísticas. E ali nos mantivemos teimando um e outro, numa e noutra
perspectiva.
Já agora vejamos o que nos diz o
teimoso Karl Popper a respeito de probabilidades:
A meio da conversa o meu
interlocutor chamou-me a atenção para um homem instalado numa mesa vizinha,
situada atrás de mim, e para a sua compleição exageradamente franzina, o seu
perfil singular, e sobretudo a voz aguda e estranha, diferente de qualquer
registo vocal humano que tivéssemos ouvido antes.
Só algumas horas depois, já em casa, me ocorreu que tal personagem podia ser um extraterrestre, um tripulante de um desses discos voadores que aparecem por aí de vez em quando, e que disfarçadamente por ali andava rindo-se das conversas tolas dos terráqueos sobre o Universo: Existem duas possibilidades, ou estamos sozinhos no Universo ou não. As duas são assustadoras. (Artur C. Clarke)
Tudo aquilo que temos vindo a
aprender sobre o nosso sistema solar e os seus planetas assim como sobre outros
planetas noutros sistemas solares, reforça a convicção de que as condições que
levaram ao surgimento da vida na Terra são extremamente particulares. São tão singulares
que mesmo que se encontre outro planeta com água, com clima estável e
temperaturas equilibradas, isso não significa que se encontre vida lá. Mas se existir
vida, muito provavelmente será de uma forma simples, tipo bactérias, seres
unicelulares.
Não podemos negar peremptoriamente
a possibilidade de existência de vida complexa noutros pontos da nossa galáxia,
ou do Universo, mas o facto é que não temos qualquer indicação de que essa vida
exista. Portanto, do ponto de vista prático estamos sozinhos no cosmos. Isto
não é uma manifestação de fé, nem uma demonstração de arrogante antropocentrismo,
é a conclusão que a Ciência nos permite tirar neste momento (ainda que amanhã
possa não ser assim).
O primeiro pecado da humanidade
foi a fé; a primeira virtude foi a dúvida. (Carl Sagan)
E se não é por ignorância dos
factos científicos, porque tantos se apegam àquele discurso infundado que mais
não é do que uma profissão de fé?! Talvez porque não acreditando em entidades
divinas necessitem agarrar-se a esse imperativo da existência de outras vidas
extraterrestres, para dessa forma vencerem o pavor de se imaginarem sozinhos no cosmos
e de nada mais existir para além da vida que conhecemos.
Ou seja, não é mais do que uma
manifestação do mítico e ancestral medo do escuro, um escuro que é mais do que
o desconhecido, é o desconhecimento=ignorância que tem acompanhado o Homem ao
longo da sua caminhada, não obstante a Luz que a Ciência veio aportando à
humanidade.
O universo não foi feito à medida
do ser humano, mas tampouco lhe é adverso: é-lhe indiferente. (Carl Sagan)
Uma
das assumpções da Astronomia é que a Terra é um planeta bastante
comum, num sistema solar bastante comum, numa galáxia bastante comum, e que não
há nada cosmicamente único em
nós. A missão Kepler recolheu indícios de que poderão
existir na nossa galáxia milhares de planetas parecidos com a Terra. Sabendo
isto, uma forma de vida parecida com a nossa devia ter evoluído algures, mas
apesar de desenvolvermos telescópios potentes não temos nenhuma prova da
existência de civilizações tecnológicas em mais nenhum sítio do nosso universo.
Ora as civilizações são barulhentas: a humanidade transmite sinais de TV e
rádio que são inequivocamente artificiais. Uma civilização semelhante à nossa
devia deixar um rasto de provas que nós poderíamos encontrar. Além disso, uma
civilização que evoluiu ao longo de milhões de anos teria muito tempo para
começar a, pelo menos, colonizar a galáxia, o que quer dizer que devia haver
mais evidências da sua existência. O físico Enrico Fermi, durante uma discussão
com os seus colegas, deixou a simples pergunta: “e onde estão eles?”,
evidenciando o paradoxo estabelecido entre a ideia de que a Terra é comum mas as
formas de vida complexas são extremamente raras no universo.
2 comentários:
Está a ver como é?! como é difícil iniciar uma conversa (isto para não me enfronhar pelo «terror» que é andar por aí a ler)?!
No caso, antes de meter pés a caminho de qualquer outra "especialidade", a saída
“Acreditar que estamos sozinhos no Cosmos é uma enorme arrogância, para não dizer uma perfeita estupidez. Basta considerar a multiplicidade dos mundos e o número quase infinito de astros que compõem o Universo para percebermos logo como são imensas as probabilidades, estatisticamente falando, de existir vida extraterrestre"
do seu interlocutor é bastante para ficar por ali
1 - a esmiuçar a "carga" da presumida proposição ou seja, a afirmada «ignorância» de quem o cataloga (a si) de ignorante;
2 - depois da «estupidez» que você traz às costas;
3 - depois a aferição dos conhecimentos de cálculo probabilístico do seu interlocutor;
4- depois a certeza na «multiplicidade de mundos» que indubitavelmente há, mas com interesse altamente questionável para os terráqueos, etc, etc...
A vida dos seres inteligentes não é nada, mas nada, fácil, amigo!
Fez-me lembrar o que se conta de um ERUDITO, um verdadeiro intelectual
(escritor e de "esquerda", evidentemente) da nossa praça que, aqui há quatro décadas, em conversa -- dessas de café, esplanada -- para "bolsar coisas" lá de cima da sua erudição, argumentava que «não gostava, embora não tivesse lido tudo, do estilo de Platão; era "pesado"!»
Um dos interlocutores, uma criatura muito menos "culta", um coitado de um "bronco", perguntou-lhe
"Mas do estilo do Sócrates gostas, não gostas?"
«Sim, claro que sim», respondeu-lhe o nosso erudito, «desse ateniense li praticamente tudo».
Chega-lhe?!
A vida dos seres inteligentes não é fácil. Hoje ainda o é menos porque há internet e, nesta, blogs, facebook, etecétera e tal.
Acautele-se -- antes de partir para certas e determinadas caminhadas ingira antes um Lorenin e habitue-se a contar até trinta e sete e meio. Ou então cale-se!
Cumprimentos
Hehehehehehehe, o tipo lera tudo, "escrito" por Sócrates e gostara, mas não de Platão?! Isso tudo ao som dos violinos de Chopin, não?
Bem, vamos lá ver, por vezes tenho destas conversas estúpidas com gente que não verificou se tinha o cérebro ligado antes de abrir a boca, mas não é este o caso, pois que a conversa em questão decorreu com o meu melhor amigo, que no final da mesma reconheceu a pertinência dos meus argumentos. Portanto, neste caso nem se tratou de uma daquelas discussões taralhoucas e inúteis. Mas na generalidade é como diz o meu amigo David, um soporífero é recomendável. Abraço.
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