Importa perceber como o povo brasileiro ficou refém exclusivamente
de opções políticas desastrosas. Importa, porque depois de Trump e de Bolsonaro
mais resultados semelhantes estarão em marcha, seja nas américas ou mesmo na
velha Europa (onde aliás já começou, veja-se a sua concretização na Polónia, na
Hungria, na Itália, e a sua expansão na Alemanha e até, pasme-se, na França).
E interpretar o resultado das eleições que elegem este tipo
de gente como uma manobra calculada e executada por grupos de interesses
económicos é uma pueril manifestação de ignorância. Ainda que tais grupos lá
estejam, investindo e aproveitando-se destes fenómenos, a análise deve ser mais
abrangente.
Uma característica cada vez mais evidente nos dias de hoje é
o extremismo das opiniões que conduz à situação de radicalismo total. E por que
é que isto acontece?
Sem dúvida que os erros da governação materializados na
corrupção, na arrogância e na prepotência dos governantes - particularmente
naqueles que se apresentam como desvelados democratas e indubitáveis
representantes do povo -, estarão na base das contestações e do desencanto das
massas; mas como é que na actualidade as pessoas se extremam, não querendo
sequer discutir as opiniões dos outros? E porque é que, em consequência, se
afastam dos legados civilizacionais, elegendo para os mais altos cargos da
política pessoas que renegam esses valores?
Talvez porque a velocidade a que a informação é
disponibilizada conduza a que os indivíduos/eleitores envolvidos na cacofonia
reinante se mostrem indiferentes, e até contrários, à aceitação desses legados.
Afinal de contas este fenómeno vem ocorrendo num mundo onde as informações
surgem permanentemente, e de todos os lados, a uma velocidade vertiginosa que
só contribui para confundir, para enganar e para cristalizar a opinião de cada
um num extremismo fanático.
Hoje, a revolução dos meios de comunicação e a explosão das
redes sociais facilitou o encontro de pessoas que pensam da mesma forma,
evitando o confronto de ideias e conduzindo os grupos a assumirem posições cada
vez mais radicais, já que discutem apenas entre si e reforçam as suas
convicções, extremando-as; convencidos de que detém a razão absoluta.
Coisa semelhante observa-se, desde há muito, entre a maioria
dos adeptos do futebol. Mas o clubismo e os clubes de Futebol não são eleitos
para governar, nem deles se espera que observem os fundamentos da democracia.
Eles existem para competir e a competição é, por si só, uma acção de extremos.
Um tudo ou nada do qual depende a superação do adversário e a vitória sobre
ele.
Regressemos ao radicalismo das posições políticas, que
impede a ocorrência da discordância, porque não há tempo nem espaço para a
discussão construtiva, deixando caminho livre para outra manifestação acéfala e
muito mais perigosa, a produção de violência – e não será necessário recordar
acontecimentos recentes em que o discurso do ódio provocou a violência material.
Sabemos que a solução para alcançar a harmonia implica
evitar os extremismos e praticar a discussão sincera em que as partes em
confronto se dispõem a ceder algo nas suas convicções, procurando uma solução
de compromisso, melhor do que aquela que tinham inicialmente porque que não
incluía o outro.
Porém, isso requer a prática de duas virtudes fundamentais cultivadas
ao longo do processo civilizacional da humanidade: a tolerância e a humildade. Mas
como é que se praticam a tolerância e a humildade nestes tempos conturbados, numa
época em que o orgulho, no seu pior sentido, o da soberba, é exaltado cada vez
mais?
2 comentários:
Perfeito, chegou-se ao fim do curral, onde as opções não bem claras, optou-se pelas que não se conheciam ainda, pois das que haviam, antes, ninguém mais queria.. Lamentavelmente
Nem mais.
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