Escrever de ouvido é escrever como me soa bem — o que, convenhamos, é sempre um critério infalível… para compor samba. Para escrever português, nem tanto. A regra gramatical? Ah, essa velha tirana, sempre a embaraçar o ritmo natural das frases com exigências que ninguém convidou para a festa.
No entanto, por vezes, a intuição traí-nos. Vejamos o caso: escrevi algures que «os ratos foram os primeiros mamíferos a serem usados intensivamente...». E logo me assaltou a dúvida — ou o remorso gramatical. Não deveria antes ter escrito «a ser usados»? Afinal, soa-me melhor assim. E se soa melhor, não estará mais certo?
Mas, se a memória ainda me serve para mais do que guardar aniversários esquecidos, creio que quando há um sujeito bem definido — como no caso dos pobres ratos —, deve empregar-se o infinitivo pessoal no plural: serem. Daí a minha escolha. Com algum desconforto auditivo, admito.
Esta permanente guerra entre a regra e a musicalidade da língua — ou talvez entre a gramática e a melodia do erro — é o que torna o português tão saborosamente confuso. Não admira, pois, que tantos optem pela língua de vaca… estufada, naturalmente, que se mastiga mais facilmente do que se digere a gramática normativa.
Em matéria de língua, reconheço: ainda tenho muito que aprender. Mas enquanto houver ouvidos, hei-de continuar a escrever — mesmo que desafine.
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