~ O naufrágio da «Medusa» ~
Para memória futura
... e os bufos
OS VELHOS PIDES DA NOVA DGS
Alberto Gonçalves no Observador.
A irrealidade, um tesouro nacional
Há escritos que devem ficar em memória permanente para atirar às fuças de tanto filho de puta pseudo-democrata que arenga loas ao Estado e à Democracia que temos; e aos patetas e bestuntos que neles acreditam. Engulam a realidade, calhordas.
.
~ A irrealidade como forma de vida ~
Mas os safardanas da política instrumentalizam tudo o que podem.
~ Judicialização da politiquice ~
A política abespinha-se com a justiça quando esta invade a
sua suposta esfera de actuação, mas não hesita em instrumentalizá-la sempre que
isso serve os seus propósitos demagógicos.
O mito de que os tribunais são aplicadores passivos das leis
aprovadas pelos órgãos legislativos, que se limitam a resolver conflitos
privados sem impacto na vida pública, não passa de uma verdade arrumada no
arquivo da história do pensamento político. Nas sociedades actuais ninguém
contesta a centralidade da justiça no jogo democrático nem a emancipação do
poder judicial, que de simples função técnico-burocrática se transformou em
verdadeiro poder da política. (...) Os tribunais definem direitos, distribuem
bens e recursos, corrigem medidas e leis e chegam a ser chamados a fazer
escolhas complexas, quando os políticos, apesar de legitimados pelo voto,
transferem o custo de decisões controversas.
Este novo protagonismo da justiça, ainda não inteiramente
compreendido, gera atritos quando, por exemplo, aparecem providências cautelares
administrativas para travar políticas públicas, quando o TC invalida opções
políticas de contenção orçamental (como no “período da troika”) ou quando um
juiz ordena a libertação de pessoas confinadas em hotéis pelas autoridades de
saúde para combater pandemias.
Esta é, se quisermos, a judicialização da política, no seu
plano inevitável e legítimo, comum em todas as sociedades democráticas. Não é
um desafio à autoridade dos outros poderes nem à legitimidade do voto; é o
Estado de direito a funcionar na sua plenitude.
Coisa diferente é a judicialização da politiquice.
Saber se os tribunais são os locais apropriados para lamber
feridas de guerra, quando os políticos se acusam uns aos outros de pertencerem
à “extrema-esquerda ridícula e traidora” ou à “extrema-direita xenófoba e
racista”, ou quando qualificam os adversários como “escumalha”, “caixote do
lixo”, “rasca”, “palhaço” ou “manso”; saber se é à justiça que compete declarar
quem venceu esses ajustes de contas e validar insultos panfletários.
A sala de audiências do tribunal não pode servir para isso.
A política abespinha-se com a justiça quando esta invade a
sua suposta esfera de actuação, mas, contraditoriamente, não hesita em
instrumentalizá-la sempre que isso serve os seus propósitos demagógicos.
O poder judicial é um poder da política; não é um árbitro da
politiquice.
A violência verbal e a agressividade argumentativa fazem
parte do debate político desde sempre. O desejo de visibilidade do sound bite
momentâneo na imprensa e nas redes sociais motiva uma comunicação que
privilegia a forma em detrimento da substância.
Em 1858, num debate entre candidatos presidenciais nos
Estados Unidos, Abraham Lincoln qualificou a política de escravatura de Stephen
Douglas dizendo que era “tão rala como uma sopa homeopática feita na fervura da
sombra de um pombo que morreu de fome”. Não consta que o autor da tirada
irónica tivesse acabado no tribunal, prostrado à frente do juiz à espera do
puxão de orelhas, nem que a vítima tivesse precisado desse desagravo para
seguir em frente.
Há ofícios com ossos mais duros de roer que outros. Faz
tanto sentido um político hipersensível à ofensa ir fazer queixinhas ao
tribunal, como um futebolista exigir que não lhe toquem nas canelas. Levar as
politiquices partidárias para os tribunais desvaloriza a política – porque esta
não precisa da tutela referencial de uma moralidade superior – e desvaloriza a
justiça – porque esta dispensa ver a sua credibilidade metida em intrigas.
Em Outubro do ano passado, Marine Le Pen perdeu um processo
no Tribunal de Cassação de França contra a revista Charlie Hebdo, que tinha
publicado um cartaz de campanha inventado com a imagem de um monte de
excremento fecal fumegante, onde se lia “Le Pen, a candidata que é como tu”. O
tribunal disse que a publicação, mesmo agressiva, reflectia uma opinião sobre
as posições da candidata e constituía uma forma de exercício legal da liberdade
de expressão. É a vida. Há dores que não se curam nos tribunais.
• Manuel Soares
presidente da direcção da Associação Sindical dos Juízes
Portugueses
Chega! de parvoíces, ó jacobinos de pacotilha
~ Está tudo de cabeça perdida ~
Está tudo de cabeça perdida, como se diz em epígrafe. De súbito não se fala senão no Chega. É que viabilizou um governo de «direita» nos Açores, é que se perfila como incontornável parceiro para futuras negociações com o PSD no continente. Coitado do Costa. Que dores de cabeça lhe provoca o Chega.
Costa não é nem nunca foi inteligente; é apenas manhoso e, portanto, não
percebeu que a geringonça que inaugurou no panorama político nacional era
perigosa e que mais tarde ou mais cedo se iria voltar contra ele. Vai daí ataca
agora o PSD. Que pisou linhas vermelhas, que saiu do convívio democrático pois
que alinhou com um partido que, à falta de melhor argumento, é xenófobo e até
fascista.
Ventura faz muito bem em ironizar com a questão. Costa não
merece outra atitude. Explicar-lhe que o Chega é um partido democrático que vem
aprofundar o convívio legitimador das soluções políticas alcançadas pois que o
seu contributo se mede pela diferença e pela novidade mas sem receio de um
alegado radicalismo que não é senão indignação não vale a pena. Seria
necessário que Costa se cultivasse o que não é sua prioridade e a que é mesmo
completamente arredio. Seria preciso explicar-lhe que a direita sociológica e
cultural existiu sempre em Portugal muito embora de tal evidência o mesmo nunca
se tenha apercebido. Seria preciso ensinar-lhe que o marxismo básico e estúpido
em que a sua formação medrou, a despontar na primeira ocasião, já não alcança
nada e só deforma as coisas. Seria necessário reformá-lo de cima a baixo. Não
vale a pena.
Os argumentos contra o Chega são de grande quilate intelectual.
Vejamos; uns dizem que os açorianos que votaram Chega são mais ou menos
atrasados e analfabetos; apareceu até um energúmeno apresentado como prof. de
uma Universidade açoriana que asseverava que era de incultura e analfabetismo
que se tratava; que outra coisa poderia ser? Santos Costa não teria dito melhor
a justificar a falta de liberdades políticas nas alocuções aos trabalhadores em
Braga em 1946. Que desconsideração pelos açorianos que são e sempre foram uma
parcela do país onde a cultura racional e o espírito crítico desde mais cedo
floresceram.
Outros, mais institucionais,
pretendem que o Chega viola os limites materiais da revisão constitucional sem
lhes passar pelas iluminadas cabeças que estes limites não estão todos ao mesmo
nível e que o Chega descontados, porventura, alguns emotivos excessos de
linguagem, os nunca poria em causa porque é um partido de filiação cristã e
pluralista, temente à dignidade da pessoa humana e apostado na reforma da
democracia política portuguesa mas que não vê na Constituição uma vaca sagrada,
sem prejuízo obviamente do respeito total pela grande maioria das soluções de
tão respeitável diploma.
Outros asseveram que o Chega
prejudica a comunicação própria do «espaço público» democrático. Coitados; não
fazem ideia do que foi a origem histórica, saída da Revolução Francesa e
divulgada na Alemanha oitocentista, da noção de espaço público. O Chega só
alarga o espaço público democrático porque o faz em condições racionais,
acessíveis, abertas ao contraditório e sem coacção. Por muito que custe a
compreender aos ditos «intelectuais» o espaço público não se alimenta só da
vulgata marxista aprendida nas creches da Voz do Operário e nas miseráveis
cartilhas da M. Harnecker e de outros subprodutos como ela.
Querem atacar o Chega? Cultivem-se e chegam lá. Usem argumentos
mais ponderosos e racionais. Se quiserem até vos posso fornecer alguns. E falo
a sério. Deixem-se é de marxismo de pacotilha e de repisar argumentos próprios
do Comintern que fariam inveja ao saudoso camarada Dimitrov. Não percam a
cabeça. Mais elevação cultural, oh zoilos! Mais um esforço e sereis cultivados
e civilizados. É que até dá votos e certamente que nos Açores.
. Luiz Cabral de Moncada
A Praça do Infante e o Jardim da Constituição; corrigir o destrambelho de 2009.
A Praça do Infante devia ser toda repavimentada com o padrão Mar Largo de calçada à portuguesa (o mesmo que possuía e que, desgraçadamente, foi retirado); idem para o Jardim da Constituição. As razões para essa alteração prendem-se com o facto daquela calçada constituir um pavimento de qualidade e de relevante valor patrimonial arquitectónico e cultural, referenciado e preservado em todo o mundo por onde andámos a fazer calçada à portuguesa: Brasil, Cabo Verde, Angola, Moçambique, Índia, Timor e Macau; com exemplos mais recentes em Espanha e nos Estados Unidos da América.
Assim, toda essa área ficaria liberta de obstáculos para poder
funcionar plenamente como sala de visitas da cidade e local de realização de
espectáculos e feiras temáticas (Feira Medieval; Feira do Livro, etc.).
Consequentemente, teria de ser removida aquela coisa a que chamam fonte cibernética que, estupidamente, utiliza água num local afectado por ventos frequentes, de Norte ou Sueste (com
evidente desperdício do precioso líquido), e que tantas vezes torna incómodo permanecer, ou
simplesmente passar, nas proximidades; e porque essa “instalação” pseudo cibernética,
que nunca funcionou bem, ocupa imerecidamente um dos espaços públicos mais importantes da cidade.
A estátua do Infante poderia manter-se onde está,
descentrada na Praça, ou reposicionada perto da estátua do Gil Eanes, cada um
com o seu pano de muralha em fundo. Assim se ganhava para o uso humano aquele
espaço magnífico, e assim se remetia a estátua da figura histórica para a
devida dimensão do seu relacionamento com Lagos já que, mesmo tendo possuído o senhorio da Vila, pouco por cá terá andado e raramente terá habitado,
sabendo-se que só residiu na região de forma permanente nos últimos 14 anos da sua vida, e mesmo
então dividindo-se entre a Raposeira e Sagres.
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O espaço pavimentado com o motivo 'Mar Largo'. Os pontos vermelhos reposicionam as estátuas de Gil Eanes e do Infante D. Henrique. |
Infelizmente, não foi construído nada semelhante à proposta acima, foi feito o que consta na imagem abaixo. E, agora, seria dispendioso corrigir, se tal fosse possível. E não é possível porque os políticos são reféns de conjunturas artificiais, por eles criadas, e que impedem o funcionamento racional das instituições. Os políticos tornam-se reféns de uma mecânica que cria apetências e desejos no eleitorado, e que depois se sentem obrigados a providenciar. Mas por muito dispendiosa que fosse esta "correcção", seria incomensuravelmente mais barata do que a obra feita em 2009.
E os custos de manutenção do espaço seriam infinitamente menores. Basta retirar a diatribe com a água, os jardins e as árvores (prejudiciais à muralha), e os custos de manutenção do espaço reduzem-se drasticamente. Acresce que a "correcção" facilitaria as soluções de drenagem de todo o perímetro, anulando ou reduzindo grandemente os espaços de quota negativa actualmente existentes e que funcionam como bacia de retenção das águas.
Talvez no futuro alguém tenha coragem para corrigir este magnífico espaço da nossa cidade. Alguém que não seja refém de si próprio ou da sua sombra.
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Quando o "belo" é inimigo dos valores do património e da lógica de espaço funcional. |
Só vai piorar!
Ainda não vimos nada!
Por António Barreto
14 de Junho de 2020
Republicanos, corporativistas, fascistas, comunistas e até democratas mostraram, nos últimos séculos, que se dedicaram com interesse à revisão selectiva da História, assim como à censura e à manipulação.
É triste confessar, mas ainda estamos para ver até onde vão os revisores da História. Uma coisa é certa: com a ajuda dos movimentos anti-racistas, a colaboração de esquerdistas, a covardia de tanta gente de bem e o metabolismo habitual dos reaccionários, o movimento de correcção da História veio para ficar.
Serão anos de destruição de símbolos, de substituição de heróis, de censura de livros e de demolição de esculturas. Até de rectificação de monumentos. Além da revisão de programas escolares e da reescrita de manuais.
Tudo, com a consequente censura de livros considerados impróprios, seguida da substituição por novos livros estimados científicos, objectivos, democráticos e igualitários. A pujança deste movimento através do mundo é tal que nada conseguirá temperar os ânimos triunfadores dos novos censores, transformados em juízes da moral e árbitros da História.
Serão criadas comissões de correcção, com a missão de rever os manuais de História (e outras disciplinas sensíveis como o Português, a Literatura, a Geografia, o Meio Ambiente, as Relações Internacionais…), a fim de expurgar a visão bondosa do colonialismo, as interpretações glorificadoras dos descobrimentos e os símbolos de domínio branco, cristão, europeu e capitalista.
Comissões purificadoras procederão ao inventário das ruas e locais que devem mudar de nome, porque glorificam o papel dos colonialistas e dos traficantes de escravos. Farão ainda o levantamento das obras de arte públicas que prestam homenagem à política imperialista, assim como aos seus agentes. Já começou, aliás, com a substituição do Museu dos Descobrimentos pelo Memorial da Escravatura.
Teremos autoridades que tudo farão para retirar os objectos antes que as hordas cheguem e será o máximo de coragem de que serão capazes. Alguns concordarão com o seu depósito em pavilhões de sucata. Outros ainda deixarão destruir, gesto que incluirão na pasta de problemas resolvidos.
Entretanto, os Centros Comerciais Colombo e Vasco da Gama esperam pela hora fatal da mudança de nome.
Praças, ruas e avenidas das Descobertas, dos Descobrimentos e dos Navegantes, que abundam em Portugal, serão brevemente mudadas.
Preparemo-nos, pois, para remover monumentos com Albuquerque, Gama, Dias, Cão, Cabral, Magalhães e outros, além de, evidentemente, o Infante D. Henrique, o primeiro a passar no cadafalso. Luís de Camões e Fernando Pessoa terão o devido óbito. Os que cantaram os feitos dos exploradores e dos negreiros são tão perniciosos quanto os próprios. Talvez até mais, pois forjaram a identidade e deram sentido aos mitos da nação valente e imortal.
Esperemos para liquidar a toponímia que aluda a Serpa Pinto, Ivens, Capelo e Mouzinho, heróis entre os mais recentes facínoras. Sem esquecer, seguramente, uns notáveis heróis do colonialismo, Kaúlza de Arriaga, Costa Gomes, António de Spínola, Rosa Coutinho, Otelo Saraiva de Carvalho, Mário Tomé e Vasco Lourenço.
Não serão esquecidos os cineastas, compositores, pintores, escultores, escritores e arquitectos que, nas suas obras, elogiaram os colonialistas, cúmplices da escravatura, do genocídio e do racismo. Filmes e livros serão retirados do mercado.
Pinturas murais, azulejos, esculturas, baixos-relevos, frescos e painéis de todas as espécies serão destruídos ou cobertos de cal e ácido. Outras comissões terão o encargo de proceder ao levantamento das obras de arte e do património com origem na África, na Ásia e na América Latina e que se encontram em Portugal, em mãos privadas ou em instituições públicas, a fim de as remeter prontamente aos países donde são provenientes.
Os principais monumentos erectos em homenagem à expansão, a começar pelos Jerónimos e pela Torre de Belém, serão restaurados com o cuidado de lhes retirar os elementos de identidade colonialista. Os memoriais de homenagem aos mortos em guerras do Ultramar serão reconstruídos a fim de serem transformados em edifícios de denúncia do racismo. Não há liberdade nem igualdade enquanto estes símbolos sobreviverem.
Muitos pensam que a História é feita de progresso e desenvolvimento. De crescimento e melhoramento. Esperam que se caminhe do preconceito para o rigor. Do mito para o facto. Da submissão para a liberdade.
Infelizmente, tal não é verdade. Não é sempre verdade. Republicanos, corporativistas, fascistas, comunistas e até democratas mostraram, nos últimos séculos, que se dedicaram com interesse à revisão selectiva da História, assim como à censura e à manipulação.
E, se quisermos ir mais longe no tempo, não faltam exemplos. Quando os revolucionários franceses rebaptizaram a Catedral de Estrasburgo, passando a designá-la por Templo da Razão, não estavam a aumentar o grau de racionalidade das sociedades. Quando o altar-mor de Notre Dame foi chamado de Altar da Liberdade caminharam alegremente da superstição para o preconceito.
E quando os bolchevistas ocuparam a Catedral de Kazab, em São Petersburgo e apelidaram o edifício de Museu das Religiões e do Ateísmo, não procuravam certamente a liberdade e o pluralismo. E também podemos convocar os Iconoclastas de Istambul, os Daesh de Palmira ou os Taliban de Bamiyan que destruíram símbolos, combateram a religião e tentaram apropriar-se tanto do presente como do passado.
Os senhores do seu tempo, monarcas, generais, bispos, políticos, capitalistas, deputados e sindicalistas gostam de marcar a sociedade, romper com o passado e afastar fantasmas. Deuses e comendadores, santos e revolucionários, habitam os seus pesadelos. Quem quer exercer o poder sobre o presente tem de destruir o passado.
Muitos de nós pensávamos, há cinquenta anos, que era necessário rever os manuais, repensar os mitos, submeter as crenças à prova do estudo, lutar contra a proclamação autoritária e defender com todas as forças o debate livre.
É possível que, a muitos, tenha ocorrido que faltava substituir uma ortodoxia dogmática por outra. Mas, para outros, o espírito era o de confronto de ideias, de debate permanente e de submissão à crítica pública.
O que hoje se receia é a nova dogmática feita de novos preconceitos. Não tenhamos ilusões.
Se as democracias não souberem resistir a esta espécie de vaga que se denomina libertadora e igualitária, mergulharão rapidamente em novas eras obscurantistas.»
O SOCIALISMO PEDINTE
"A imagem do PM António Costa com o PM holandês, Mark Rutte, há umas semanas em Haia vale mais do que mil palavras. Rutte faz uma vénia leve com a cabeça, o novo tratamento dos tempos do Covid. Costa está dobrado, simbolizando, com aquele gesto, a dependência absoluta do regime socialista em relação ao dinheiro europeu. Aquela é a fotografia do socialismo pedinte que nos governa.
Em Portugal, os dirigentes socialistas falam com voz grossa contra os holandeses e contra Orban. Mas quando toca a receber dinheiro da Europa, tudo se faz e tudo se esquece para receber os fundos e o capital que o regime socialista precisa para sobreviver, fazer negócios e reforçar o seu poder em Portugal.
A economia portuguesa enfrenta dois problemas muito complicados (estão ligados): falta de capital para investir e uma dívida (pública e privada) brutal. É um país sem capital e endividado até ao pescoço. O Banco Central Europeu é absolutamente crucial para gerir a dívida. Sem BCE e sem Euro, Portugal estaria falido. Em relação ao capital, durante uns anos, os dinheiros chinês e angolano disfarçaram a realidade. Mas, por razões diferentes, já não podemos contar com investimento chinês e angolano. A maior fonte de capital, dos últimos 35 anos, Bruxelas, torna-se ainda mais indispensável. A economia portuguesa não sobrevivia sem a União Europeia. E no partido socialista, todos sabem isso. As irritações de Costa com os holandeses e os desabafos de Pedro Nuno dos Santos contra Merkel são absolutamente irrelevantes.
Muitos em Portugal celebraram o último Conselho Europeu com um “momento histórico” para a Europa. Terá sido. Mas também foi um momento do maior “fracasso histórico” do regime português desde o 25 de Abril: aproveitar a integração europeia para fortalecer a nossa economia e construir uma sociedade próspera. Três décadas e meia depois, e muitos mil milhões de euros oferecidos por Bruxelas, temos uma economia fraca e vivemos numa sociedade remediada. Tal como em 1985, em 2020, continuamos na cauda da Europa e a pedinchar dinheiro. Eis, a maior vergonha da história portuguesa dos últimos 35 anos.
Muitos socialistas também pedem à União Europeia para ser uma verdadeira “união de transferências” (de dinheiro, bem entendido). Ainda mais? Desde 1985, Portugal recebeu de Bruxelas mais de cem mil milhões de Euros a fundo perdido. Quando o país ficou insolvente, em 2011, a União Europeia emprestou mais cerca de 50 mil milhões de Euros (o resto foi o FMI) para a economia nacional sobreviver. Se isto não é uma União de transferências, o que é? Agora os responsáveis socialistas garantem que se vai “usar bem o dinheiro que aí vem.” Pergunto: alguém acredita que um governo socialista sabe gastar bem dinheiro? Ninguém acredita. Não acreditam os holandeses, não acreditam os portugueses e não acreditam os ministros do nosso governo. Como mostra a realidade desde 1995, os governos socialistas sabem desperdiçar recursos, não sabem investir.
Só há uma maneira de os fundos que aí vêm não serem inteiramente desperdiçados, tal como sabem os holandeses e os alemães: uma fiscalização por parte da União Europeia. Ainda não é claro nem certo, mas tudo aponta para que a Comissão Europeia e o Conselho controlem a utilização dos empréstimos e dos fundos oferecidos. Nesse sentido, as decisões do Conselho Europeu indicam o fim da “união de transferências” e o início de uma união económica e financeira. Haverá mais fundos e dívida comum europeia, mas os pais mais dependentes, como o nosso, vão perder soberania e poder. Cada vez haverá mais decisões tomadas em Bruxelas e menos em Lisboa.
Tudo isto é trágico: a dependência total da União Europeia e a absoluta falta de confiança no governo para investir os fundos da melhor maneira. Desde 1985, Portugal teve tudo para ser um país com uma economia forte, uma sociedade próspera e independente politicamente. O objectivo dos fundos europeus é enriquecer para ser mais independente. O nosso regime político, do passado, recebeu independência, e ao futuro deveria deixar prosperidade. Mas falhou. Continuamos pobres, cada vez mais dependentes de Bruxelas, e deixamos um monte de dívidas para o futuro. Nunca tão poucas gerações traíram tanto muitas outras gerações. As que já morreram, e as que estão por nascer. Como foi possível isto acontecer?"
João Marques de Almeida In OBSERVADOR, 26 Jul. 2020