Carcaças e papo seco
Joana Amaral Dias
22 Outubro 2023 — 00:15
Quem não tem dinheiro para comprar um carro novo vai pagar mais IUC por guiar um chasso velho. Eis a sinopse da polémico com o Imposto Único de Circulação (IUC) -- que pode aumentar mais de 1000%- uma espécie de nova versão do "não têm pão, comam brioches".
A falácia da fiscalidade verde continua. Não resolve os problemas
ambientais e prejudica sempre os mais desfavorecidos. Taxar à bruta carros
antigos não incentiva o abate porque trocar de carro é para quem pode. Ou acham
que a esmagadora maioria das pessoas que têm um calhambeque a cair aos pedaços
é porque gosta? Claro. Deve adorar as despesas constantes de oficina, as
funcionalidades disfuncionais, o desconforto, a insegurança.
Ou acham que os remediados insistem em andar com carros podres e
poluentes por défice de consciência ambiental e que será mais esta roubalheira
fiscal que lhes meterá juízo e os levará a correr para comprar uma bomba
eléctrica reluzente? Por favor.
Esta medida é mais um imposto sobre a pobreza. Entretanto, circulam
millhares de viaturas que não pagam IUC e que custam tanto como as casas onde
vivem muitos dos que têm os ditos carros velhos agora condenados.
E não venham com a história de que com o dinheiro do abate pode
comprar-se um carro mais recente. Tal maquia só dará, na melhor das hipóteses,
para adquirir outro chasso. Ou então um carrinho de linhas.
Portanto, os mais carenciados lá arranjam um popó que mal rola, para
poder ir trabalhar numa país quase sem transportes públicos e depois pagam
impostos para financiar o IVA de carrões eléctricos, de um verde muito duvidoso
e de gente rica. Sobre as minas de lítio para estes automóveis, António Costa
já não tem nada a dizer, pois não?
Aliás, que tal medidas musculadas dirigidas às empresas mais
poluidoras? Meia dúzia dessas teriam, sem dúvida, um efeito muito superior ao
que mais este injusto imposto trará. E discutir o incentivo aos jactos privados
em Portugal?
É que Tires põe Portugal no "top 3" da intensidade de
emissões de CO2 de jactos privados, de acordo com um relatório da consultora
ambiental CE Delft e da organização ambientalista Greenpeace.
Mesmo assim, esse Aeródromo constrói agora uma segunda pista exclusiva
para aterragem de jactos privados com futebolistas. Foi necessário demolir um
bairro inteiro! Note-se que uma viagem média num destes aviões produz CO2
equivalente a conduzir um carro a gasolina de Paris a Roma 16 vezes. Aliás, 1%
da população mundial é responsável por mais da metade das emissões da aviação
de passageiros.
Enfim, mais desta fiscalidade verde que, tal como eficiência energética
das casas ou o vestuário, irá apenas onerar os mais desfavorecidos.
Esta medida do IUC pode ser até inconstitucional e Marcelo - bem como
qualquer partido- pode pedir ao Tribunal Constitucional que se pronuncie.
Oxalá. Até porque está em causa o princípio da proporcionalidade.
O incentivo ao abate destes até veículos pode ser implantado de modo
equilibrado, e não com a punição compulsiva de quem já esta castigado pela
vida. Fingir que se salva o ambiente trucidando os pobres é obsceno demais.
Mesmo para este governo de Marias Antonietas.
Psicóloga clínica. Escreve de acordo com a antiga ortografia
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