Lagos em meados do Séc. XIX


Lagos em meados do séc. XIX
por Francisco Castelo
(transcrição com adaptação de um texto de 1860, de Inácio de Vilhena Barbosa)

A meio dos anos mil oitocentos Lagos tinha uma população de 8.400 habitantes, sendo a segunda cidade do reino do Algarve.

Erguendo-se sobre três colinas existentes na margem direita de um pequeno rio (com cerca de meia légua de extensão), a cidade está situada na face ocidental de uma grande baía que recebe o nome da cidade. A barra do curso de água que forma o porto da cidade é defendida pela fortaleza da Ponta da Bandeira, que serve de registro, e pelo forte da Meia Praia. Para defesa da baía há diversos fortes em melhor ou pior estado de conservação, sendo o principal a fortaleza do Pinhão, edificada primitivamente em terra firme, e que ainda nos princípios do século passado [XVIII] formava uma península, mas que actualmente está cercada de mar, e arruinada, passando pequenas embarcações entre ela e terra. Outra fortaleza que se fez em frente a esta, para a substituir, também foi arruinada pelo mar. A barra, que há cem anos [c. 1750], apresentava sete a oito braças de fundo, agora apenas tem uns dez palmos.

A cidade tem duas paróquias: Santa Maria, que é matriz, e S. sebastião. A primeira encontra-se estabelecida na igreja da Misericórdia, desde o sismo de 1755 que destruiu a anterior igreja matriz [de Santa Maria da Graça]. A tentativa de reerguer o templo ficou-se pelas meias paredes tendo a obra parado aí e o espaço sido usado como cemitério nos tempos sequentes. A segunda paróquia foi edificada numa colina da cidade. É um grande templo de três naves, de fundação muito antiga, e reconstruído por D. João II que lhe trocou a invocação primitiva de Conceição pela de S. Sebastião, por ser este santo padroeiro o advogado contra a peste que então assolava todo o Algarve. Existem ainda a igreja de Santo António, que é capela militar, e várias ermidas. O edifício outrora ocupado pelo trem e igreja de Stª Bárbara serve agora de quartel militar; e a antiga igreja de S. Brás, e a de Nossa Senhora do Porto Salvo, construída no séc. XVI por comerciantes italianos que vieram estabelecer-se em Lagos, acham-se transformadas em armazéns de arrecadação pertencentes ao quartel. Lagos possuía também quatro conventos. O das freiras carmelitas, de Nossa Senhora da Conceição, fundado em 1554, bastante danificado em 1755 e reconstruído depois. O dos frades franciscanos, edificado em 1560; o dos frades trinos, fundado em 1599; e o de S. João de Deus, em que se estabeleceu um hospital militar, levantado em 1696.

A cidade conta com quatro praças e algumas ruas boas, porém as outras são estreitas e tortuosas, e todas mal calçadas. Um aqueduto, obra de D. Manuel, conduz bom caudal de água vindo do Paúl. Percorrendo uma extensão de 410 braças, abastece a povoação e fornece aguada aos navios. Para este fim existe um chafariz junto à Porta Nova e da muralha, que cai sobre o rio.

Lagos é praça d’armas e a sua primeira fortificação data do reinado de D. Afonso IV, ou talvez do tempo de D. Diniz. Constava de uma cerca de muros com torres e portas. Nos fins do séc. XVI, inícios do séc. XVII, edificou-se nova cerca de muralhas, que ao presente se conserva, com oito portas e catorze baluartes. Para o lado do rio tem as portas de S. Gonçalo, do Cais, de S. Roque, e Nova, e cinco redutos. Para o lado de terra tem as portas de Portugal, do Postigo, de Quartos, e da Vila, e nove baluartes.

Lagos exporta cereais e legumes, muitos figos, algum vinho, aguardente, muito peixe salgado, azeite de oliveira e óleo de peixe, e diversos produtos de palma e de fio de piteira. Embora possua uma agricultura que em certos anos regista boa produtividade, as pescas são a actividade principal. Empregam-se nelas muitas embarcações e centenas de pescadores que não limitam a sua actividade ao Algarve mas demandam, também, Marrocos. A pesca do atum assume grande importância. A feira anual realiza-se a 12 de Outubro.



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