O regaço da avó

O regaço da avó era um refúgio tecido em pano gasto e cheiro a alfazema. O avental — sempre limpo, embora já sem cor definida nem padrão discernível — era uma extensão do seu coração e das suas mãos.

Protegia a roupa do labor diário, sim, mas fazia muito mais: servia de luva improvisada para agarrar o tacho a fumegar no fogão; de cesto de generosidades, onde se transportavam ovos quentes da capoeira, batatas arrancadas da terra húmida, folhas viçosas da horta e frutos maduros do pomar. Chegou até a levar lenha miúda, colhida à pressa, para reanimar o lume do lar.

Com o mesmo avental, a avó acenava, em despedida silenciosa, aos que partiam — e o pano ondulava no ar como uma bandeira de saudade, até onde a vista o permitia. Mais do que um gesto, era uma promessa de regresso. Com ele, também chamava os que se demoravam nos campos, ergue-o bem alto, sinal de que o jantar esperava e a noite se avizinhava.

Sempre que uma criança caía e as lágrimas lhe sulcavam o rosto, era nesse tecido que se secavam as primeiras dores — suaves, ligeiras, mas sentidas como tragédias. O avental amparava o choro e devolvia consolo.

Ali, no regaço da avó, acolhiam-se os mais pequenos, os tímidos, os assustados — fossem netos, pintainhos tresmalhados ou gatinhos enregelados. E desse ninho improvisado saíam, por vezes, pequenos milagres: figos escondidos nos bolsos, cerejas frescas ou pinhões como tesouros, que despertavam sorrisos nos rostos mais jovens. Era também nesse colo que se ouvia o eco das histórias de encantar, contadas ao cair do dia, entre o lume brando e o cheiro a sopa feita de memórias.

E quando o sono não vinha nesse abraço quente, era dele que se partia — cambaleando, de olhos semicerrados — rumo à cama, onde o corpo repousava do frenesim das horas.

Do regaço da avó desprendiam-se, sem alarde, os bocadinhos mais doces da vida — e talvez os mais duradouros também.




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