É caricato como algumas mentes pouco dadas à reflexão se aventuram a esgrimir convicções assentes numa experiência de vida pressupondo que essa experiência, apenas porque foi vivida, representa a verdade. De uma penada é varrida a razão kantiana que tantas objecções levanta à validade absoluta do conhecimento empírico.
Nivelar por cima, sem cultivar uma atitude elitista (pois, se o elitismo se instalar será por acção natural), será, sempre, exercício mal interpretado, sobretudo por aqueles que defendem que a validade do conhecimento reside nas práticas acumuladas de uma vida.
Rejeito as atitudes que definem a cultura por classes, posturas provenientes de uns que se julgam mais cultos, quer os que as manifestam petulantemente de uma posição aparentemente superior, quer os que fazem da boçalidade um arauto apologético da pureza de uma certa “cultura popular”.
Mas que é hilariante, lá isso, é. Cinismo de quem ri, ou falha de quem está a aprender?
A minha promessa é esta: Falharei mais vezes, até ao fim. E ninguém me impedirá de o fazer.
«Tenta outra vez. Falha outra vez. Falha melhor.»
Samuel Beckett
Samuel Beckett
cínico: pessoa sem pudor, indiferente ao sofrimento (ignorância) alheio.
reescrita em Ago 2014:
reescrita em Ago 2014:
É caricato como
algumas mentes pouco dadas à reflexão se aventuram a esgrimir convicções
assentes na sua experiência de vida pressupondo que essa experiência, apenas
porque foi vivida, representa a verdade. De uma penada é varrida a razão
kantiana e as suas objecções à validade absoluta do conhecimento empírico,
assim como a riqueza de conhecimento que advém do confronto de experiências
diferentes.
Nivelar por cima será
sempre um exercício mal interpretado, sobretudo por aqueles que defendem que a
validade do conhecimento reside nas práticas acumuladas de uma vida, ou por
aqueles programados no conceito laudatório da mediania (leia-se mediocridade) e
da suposta igualdade universal.
Rejeito os arautos da
verdade, sejam daqueles que se manifestam petulantemente do alto de alguma
cátedra, seja dos que fazem da boçalidade a apologia de uma certa “cultura
popular”.
Discuta-se, porque da
discussão nasce a luz. Mas apenas entre quem fale a mesma língua, sob pena de
se estabelecer menos que cacofonia. Isto é, verifique-se previamente o
entendimento dos conceitos e a igualdade dos significados. Sem isso, discutir é
tempo perdido.
31 comentários:
"Falharei mais vezes, até ao fim. E ninguém me impedirá de o fazer"
Ora bem! Assim é que é. E isso, meu caro, é vida.
não concordo é nada com a definição de ciníco.
a definição foi meio inventada para adaptação à utilização pretendida.
;)
«a palavra vale o que eu oferecer e o que o leitor permitir»
efe wild
:D
à conta do teu post,fui à 'filosofia para principiantes' e vi que Kant defendeu a combinação do empirismo com o racional, em que a sensibilidade e o entendimento se conjugam na construção do conhecimento; concordo que esse nivelar por cima é mal interpretado, donde resulta que uma pessoa liberal, em terra de queixumes e descontentamentos, torna-se cínica e «outsider», pois o cinismo é a loucura do bom senso
(o 'teu' Kant defendia que a Razão Pura exigia uma Moral acima de tudo: até da vida!... ora abóbora!
E eu não disse nada diferente doq ue dizes Maria: "tantas objecções levanta à validade absoluta do conhecimento empírico." Está ali o "absoluta".
:)
Quanto à moral, uma qualquer moral, acho que estará sempre presente, quer seja por convicção ou fraqueza do indivíduo.
para uma pessoa com 83 anos (segundo o teu perfil, se bem que a fotografia...), estar contra o elitismo snob e o populismo bacoco é compreensível: o problema é que não conseguimos ficar 'em cima do muro' por muito tempo -- por problemas nas articulações ou no ouvido interno, acabamos todos por cair e lá vamos moralizar as nossas histórias de vida...
e isso não é sinal de bom senso!
Seria levado a concordar contigo, se ao menos percebesse de que falas quando referes "lá vamos moralizar as nossas histórias de vida...". É que eu acho que sou um "imoralizador" nato. Poderei estar errado, claro, que isto de reflectir sobre os nossos actos e sobre nós próprios não é tarefa fácil. Mas, assim, confesso que não compreendo.
:\
moral da história: enquanto fores falhando, vais vivendo o que para ti é experiência racionalizada; afinal, porque é que te atiraste ao tema do 'falhar'?
moral da história: assim, cada falha, ou alguma das falhas, poderá ser um êxito?!
Porque me atirei ao tema do "falhar"? Não sei. Ou não tenho a certeza. Talvez se relacione com o livreco que publiquei há dias e com a eventual apreciação errada que a n. (que me comentou mais acima), terá feito, ao julgar que eu considero ter falhado, com essa publicação. Se assim foi, enganou-se pois fiquei satisfeito com o resultado (que indica que sigo no bom caminho na técnica do escrever - a arte da escrita ainda não está em apreço, isso é mais para a frente). Talvez brincasse com aqueles que não entenderam o desafio, que não terão percebido o que pretendia e que se lançaram na crítica ao conteúdo do livreco. Bem sei que é assim que se deve fazer pois numa obra literária (boa ou má) a forma é indissociável do conteúdo. Mas eu chamei a atenção para esse aspecto inusitado da minha pretensão.
E, ao brincar, deitei-me, coloquei-me na posição de quem se rende, talvez por não aceitar discutir mais o assunto - porque já recolhi as opiniões que pretendia. Talvez porque sou um brincalhão, alguém que se recusa a levar total e completamente a sério todas as coisas e todos os momentos da vida. Não sei, pronto. E nem isso me preocupa. Mas se existir aí algum aspecto interessante que tenhas detectado, gostava de saber, pois sempre dediquei alguma atenção à auto-crítica e à reflexão frequente sobre o que aconteceu no dia que findou: quem disse e fez o quê, o que disse e fiz eu, e porquê. É um exercício interessante que, no mínimo, nos ensina algo sobre os outros mas, sobretudo, sobre nós próprios.
Não vejas aqui o exercício de uma consciência esclarecida, humilde ou preocupada em melhorar. Acho que esta maneira de ser se inscreve num leque mais vasto de atitudes que radicam num certo egoísmo (bem, isto dava pano para mangas, mas não vou mais longe).
ou será "diletantismo", ou cinismo, Maria?
o que achas?
Pois. Parece-me que me enganei. Da mesma forma tenho que reconhecer que não entendo qual foi desafio (teu). De todo o modo, não penses que se o tivesse entendido me tinha demitido de dizer sobre, como fiz :)
Espera lá, estás a querer dizer que foi a crítica que validou um livreco em 'obra literári', é isso?
Não, nada disso, a crítica não fez coisa nenhuma.
Em 1º lugar agrada-me muito que não te demitas dessa excelente veia crítica.
Em 2º, se procurasse uma crítica ao livro, no sentido tradicional do termo, a tua seria a melhor que me foi enviada (escrita).
E agora vamos então esclarecer o "desafio". Na realidade ele só foi "desafio" para as quatro pessoas a quem o coloquei directamente. Mas, para os outros que pretendessem criticar, estava lá no "Desígnio" a intenção/preocupação do autor com a Forma. Aliás, procurei evitar que a história assumisse a importância que, normalmente, deve ter, derivando as atenções para o que realmente me interessa: os aspectos mais formais da escrita, como a sintaxe p. ex. (e o próximo ainda vai ser nesse sentido, embora não repita a fórmula de desconstrução da história pois, não me apercebi, atempadamente, quão defraudados os leitores poderiam ficar).
Já agora n. aqui fica a página das críticas (dadas as circunstâncias que levram à publicação do livro, continuo a preferir a primeira, assinada pelo Armindo de Jesus). Falta lá uma das mais importantes para mim, embora muito lacónica e que dizia simplesmente: "escrita clara. sintaxe correcta. pronto para o Romance" (erra redondamente no 'pronto para o Romance'. espero que não esteja errada no resto pois foi crítica de pessoa formada em Língua e Literatura). Como já tinha recolhido crítica semelhante no que toca ao "escrita clara" por outra pessoa, também formada na mesma área, começo a pensar que fiz alguma progressão nesse âmbito e a ficar animado para a escrita.
http://editoranabissa.blogspot.com/
;D
Percebido.
Mas olha lá, se tu próprio precisaste de uma narrativa para 'aplicar' o exercício, como querias tu que a leitura não o exigisse, se ler (leitura atenta) é mais difícil do que escrever?
Pensa lá nisso.
correcção: continuo a preferir a segunda, assinada pelo Armindo de Jesus, crítico de artes.
(adoro os posts mais antigos do blogue dele: http://escarnho.blogspot.com/)
Eu pensei nisso. Mas volto a insistir, estou a escrever numa fase em que, obrigatoriamente, tudo se rende à forma (tal como as fotografias tiveram que se render às palavras - ali, também fiz questão que as fotos não tivessem qualidade especial - excepto a da capa). É capaz de ser um erro, ser má aposta, ou demasiado atrevido, sei lá. Ainda não estou a construir frases, períodos, parágrafos como gosto de ler nos outros (nos que gosto). Portanto ainda tenho que exercitar mais.
Não quero saber dessa história de que o amis importante é o que se tem para dizer, e que pior ou melhor, devemos escrver como sabemos...blá... blá... Isso é para depois. Depois logo escrevo com total atenção e dedicação a todos os aspectos. Agora estou ainda a fazer "redacções". Bem sei que nem todos podem, ou aceitam, publicar coisas assim, neste estádio. Mas eu sou eu. Quero mais tarde agarrar dois ou três livrecos retirados da estante e verificar o que evoluí, se evoluí. (E por outro lado, publicado, já nãos e altera mais - essa praga das revisões).
Isto foi parte do que eu disse lá, na apresentação do livreco.
eu conheço o blog (por alto) pelos teus links. Sabes que eu tenho um faro muito bom para relacionar estilos de escrita? Ah Pois. E a relação que estabeleço não é a dessa crítica de que falas, é com outro texto. :)
Sobre as opiniões de que falas antes, parece-me que são essas que melhor te podem esclarecer no que respeita questões técnicas. Logo... mas tinhas esse tipo de dúvias? então não lês o que escreves, pá?
Hehehehe...eu leio o que escrevo, pá. Mas as limitações, são as limitações. Ainda não percebeste que o desafio maior é contra mim próprio? É a tentativa de me superar a todo o momento?
E sim, esse outro texto também é dele "plasmando Camilo"... hehehe.
Grande faro.
;)
O próximo desafio vai ser levado da breca. Meto-me em cada uma...
Construir diálogos entre os marujos de Gil Eanes. Onde raio vou eu arranjar léxico da época?
(é evidente que me refiro a vocábulos que designam objectos, funções, atitudes). A este respeito fiquei bansado com a leitura do 1º cap. de "O ÙLTIMO NEGREIRO" do Miguel Real, disponível online na Bertrand. Só com um dicionário de termos do séc. XVIII. Mas é magnífico.
"banzado". Eu não aguento estes diálogos escritos em tempo real. Dou erros, e isso irrita-me.
:|
Pá corrige os comentários deste post e publica que já deve dar um bom livro. Mas em folhas maiores que as das freiras são pequenas demais.
E hoje apareces na Batata, cão?
Olá, zarolho descontínuo.
Atão, tens um cu muito grande, e as folhinhas não chegam?
hehehehehe...
Sou capaz de aparecer, mas só lá para as 5h00 pa fotografar as carraspanas na areia.
Que vais fazer lá, urso velho?
Aquilo é pós putos.
achei muito interessante a defesa desse teu trabalho de escrita, pois, ao referires algo que para ti é/foi muito concreto, as tuas acções surgem perfeitamente justificadas; donde a contradição no que escreveste em resposta ao meu post da moral da história: dizes não ter uma «consciência...preocupada em melhorar» -- a consc., quanto a mim, revela-se nas atitudes e a tua atitude nos posts que escreveste sobre o teu trabalho é de quem faz questão de seguir em frente, melhorando
parabéns!
p.s.: eu não gostaria que considerasses o cinismo de modo negativo; é, apenas, uma visão alternativa das coisas
:)
As visões alternativas das coisas agradam-me bastante. Já agora, e dilatando mais a aplicação do conceito, reconheço é que nem sempre tenho capacidade para as entender. Incorporá-las, integrá-las, então... (a resistência à mudança é coisa considerável).
Maria, eu dou alguma atenção aos meus defeitos, e a simples suspeita de incorrer em mais algum - sobretudo daqueles que reputo mais graves -, deixa-me com os sentidos alerta. E sim, considero o cinismo como algo negativo.
Em certa medida, sou paradoxal: acreditando que não devo transigir e preocupar-me com o que os outros pensam, e seguir em frente, acabo por adoptar atitudes que denunciam a minha preocupação com a opinião dos outros (mas isto não me preocupa nada - acho que é fenómeno natural).
Voltando ainda aos defeitos pessoais, o facto de ter consciência deles não faz com que, automaticamente, os consiga corrigir. Afinal, "a resistência à mudança é coisa considerável".
A única coisa que me assusta na escrita é NÃO ESCREVER. E tenho razão para temer tal coisa. Sou demasiado preguiçoso e, faltando as "provocações", não acontece nada. As coisas mais intensas que escrevi, fi-lo sob tensão, angústia, raiva... ou paixão, no caso da poesia.
Pode ser que um dia seja a serenidade o motor da escrita. Até lá, vou aprendendo a juntar melhor as palavras.
;)
reli os comentários sobre o tema da escrita e fixei a declaração (embora em tom interrogativo) de n. (pelas 9.02 PM de ontem): «ler é mais difícil do que escrever»:
são competências que não se podem comparar,donde, o que conta, é o gosto de cada pessoa; há críticas injustas, porque o criticado, apesar de se ter esforçado, não consegue agradar a todos!
manual de cínicos: eu sou um escritor horrível e uma grande quantidade de pessoas tem um gosto horrível
( o cinismo é a loucura do bom senso )
hehehe... essa citação do manual é engraçada.
maria, a n. fez uma execelente crítica ao Claustro Fobias no blogue "lagos". E escreve muito bem, transformando coisas, aparentemente, corriqueiras e mundanas, reflexões e simples acometimentos do espírito em textos belos (ver o blogue "coisa ruim").
os blogues referidos estão ligados aqui ao lado, na coluna "outros claustros".
ainda sobre a questão da dificuldade do ler e do escrever: Parece-me questão semelhante à que o aforismo (se não é promovo-o) UMA IMAGEM VALE POR MIL PALAVRAS, levanta. Por um lado será verdade, pois quantas vezes uma imagem nos toca profundamente?! Por outro lado, se considerarmos que todo o sentimento tem que sofrer uma descodificação que passa pela linguagem, interiorizada, isso significa que um bom escritor poderá, em mil palavras ou menos ainda, transmitir o mesmo que uma boa imagem.
Ler, com entendimento correcto e profundo (evito o "total) poderá ser tarefa árdua mas, suspeitando existirem pessoas capazes de tal feito, porém incapazes de escrever, sou levado a concordar com a maria. São coisas distintas, embora ligadas (não concebo que se consiga escrever sem dominar o entendimento da leitura).
maria, eu referia-me a dificuldade, não a gosto e, assumo, foi muito na base da experiência pessoal e não de algo que possa generalizar (porque não sei). Acontece que escrever é uma coisa de dentro para fora (processa-se na nossa cabeça, não há lugar a grande dispersão de ideias, é um acto mais ou menos focalizado - mais do que na oralidade em que estamos a dizer alhos e pensar uma sucessão complexa de bugalhos muitas vezes sem nos darmos conta disso - tb podemos dispersar mas não nos será difícil nomear, é para isso que ali estamos; pode é sair uma tremenda de uma confusão, por isso se faz revisão, e apaga-se excessos ou lateralidades desviantes, caso o entendamos fazer) ler é uma coisa de fora para dentro, exige um maior domínio para rejeitar os nossos alhos e os bugalhos e alinhar nos talos sagrados de quem escreveu. Uma espécie de entrega que pressupõe uma ausência de nós mesmos, anulação, aderência incondicional.
Quanto às críticas serem injustas, e no caso, o objecto de crítica nunca é o individuo. Pode é ser uma critica choninhas ou magistral (com os passos intermédios entre uma coisa e outra). A crítica, tal como a obra, não se dirige ao autor, dirige-se a leitores.
efe, dominar o entendimento da leitura, tranquiliza-nos muito quanto a sintaxes e outras axes. Acredita em mim.
Posso garantir-te que durante um longo período da minha vida li muito, e li mal. Quando comecei a ler bem (e desde então li muito menos, diria pouco - se comparado) deixei de sentir alguns dos problemas que sentia com a escrita E se queres que te diga, em concreto, quase nem dei por isso, foi um processo muito natural.
"foi um processo muito natural". acredito, e é isso que é lixado, o não se poder comprar no hiper-mercado.
hehehehe...
bem, vou ao lançamento (prefiro apresentação) do livro do Nídio Duarte.
;)
lixado como??? bem, deves estar a ironizar, suponho.
de todo o modo, eu digo com cada coisa... (não há lugar a dispersão de ideias - claro que há! mas despeja-se :))Na poesia é que deve ser necessário um bisturi afiadissímo. :)
hehehe...ironizava sim, mas comigo, com a ausência de ocorrência desse "processo natural". vou aguardando...
;)
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