Havia os que queriam ser aviadores, médicos, condutores de máquinas pesadas, pescadores e eu, que queria ser professor ou escritor – convém referir que elegíamos sempre uma alternativa à preferência principal, eis como o Paulinho, que sonhava vir a ser médico, não enjeitava a possibilidade de trocar o prontuário farmacêutico pela consola de comando de uma grua da construção civil. Era assim nos tempos da infância.
A panca de vir a ser professor foi-se atenuando com o passar do tempo e o contacto com esses espécimes enjaulados que, estoicamente, insistem nessa estranha missão de tentar ensinar qualquer coisa de útil ou importante aos infindáveis exércitos de térmitas que frequentam a instituição escolar. E o sonho eclipsou-se aí pelos finais dos anos 70, quando passei a sentir pena pelos professores. Quanto à alternativa, manteve-se como sonho até ter descoberto, em tempos mais recentes, que se pode escrever sem ser escritor. Escrever, simplesmente, passou a ser o meu desígnio.
Mas voltemos aos professores e à situação a que aqui venho dar eco, alfinetado pelo silêncio culpado. Parece-me uma causa justa mas, não conhecendo os meandros do assunto, já que sou apenas um indolente bate-chapas, opto por deixar aqui o eco, sem mais comentários, dirigido aos meus oito leitores habituais.
Professores trabalham mas não recebem. Leiam aqui. Já não fico admirado com o rumo que este país leva mas assusta-me a possibilidade de, qualquer dia, deixar de ficar revoltado com estas coisas.
7 comentários:
Esse último parágrafo lembrou-me do medo que tenho de um dia fazer meus dois versos de Ruy Belo, do "Como Quem Escreve Com Sentimentos":
A vida é uma coisa a que me habituei
adeus susto e absurdo e sobressalto e espanto
E será que os poetas não publicam os poemas também com essa finalidade? Para que os outros se "apropriem" deles? Eu não sei, porque o único episódio poético-literário da minha vida foi dirigido a uma pessoa e os poemas eram mesmo para ela. Para que se "apropriasse" deles.
Mas podes sempre usar a fórmula: "Poema meu, criado pelo Ruy Belo".
;)
nunca soube o que queria ser, continuo sem saber o que quereria ter sido (ou ser), só sei que seria bem muitas das coisas que poderia ser, excluindo sempre o ser professora. :)
Pois olha n., eu continuo a achar que é uma actividade potencialmente gratificante. Acho que pode acontecer "magia" e, até, poesia no acto de revelar coisas novas, de suscitar o raciocínio, de treinar as mentes das crianças e dos jovens. Infelizmente, a velocidade a que a vida corre hoje (alheia ao ritmo natural do pulsar humano) com a consequente decadência do respeito pelo próximo, construíu sociedades em que essa e outras profissões passaram a ter esse potencial gratificante profundamente comprometido. Cada vez há menos coisas giras para fazer em colectivo (excluo as palhaçadas pseudo recreativas e desportivas). Desconfio, até, que cada vez procuramos menos contacto com os outros. Neste particular estou a falar de improviso, sem grande reflexão. Talvez pense mesmo assim.
:)
Eu sempre quis ser Deus, mas na tenho estudos para isso.
"eu continuo a achar que é uma actividade potencialmente gratificante."
não disse em contrário.
eu só sei que com tanta coisa que podia ser «bem», seria burrice, da minha parte, escolher uma coisa que penso seria «mal», percebes?
ahhh...ok.
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