As motas em Lagos

Usar um motociclo como meio de deslocação pode ser muito mais do que uma simples opção de transporte, uma necessidade de vencer a distância entre dois pontos. Viajar de mota pode remeter para um estado de espírito que cultiva o gosto pela liberdade dos espaços amplos materializada no prazer do vento soprando no rosto, ou para uma atitude social mais crítica, solta e irreverente. A mota é, de alguma forma, o substituto do cavalo com que os intrépidos viajantes conquistaram territórios, transpuseram a barreira da distância, estabeleceram novos relacionamentos e criaram novas comunidades.
O homem usa o cavalo há mais de 6.000 anos, deslocando-se com ele em velocidade mais rápida do que as suas pernas o permitiriam. E desde então foi montando animais e máquinas que muito lhe facilitam esse esforço de locomoção e transporte dos bens. Não são apenas os que mantêm essa relação directa com os equinos, que dão continuidade a tal herança mas, também, aqueles que usufruindo das invenções tecnológicas preservam esse espírito. O espírito de quem salta para a sela e parte em viagem, numa simples deslocação ou à conquista do distante.
No século XIX, em plena era industrial, em que a tracção animal ainda era o meio de transporte mais usual, a engenharia tentou alterar essa situação procurando motorizar qualquer veículo que se movesse fora de carris. Os motores já existiam, mas eram estacionários, gigantescos e de funcionamento precário. Impróprios para instalar nos frágeis veículos biciclos ou triciclos, então construídos.
Desde o alemão Gotlieb Daimler, considerado o "pai do motociclismo" devido à invenção de um motor de 264 centímetros cúbicos com meio cavalo de força a 500 rotações por minuto, movido a gás – mas que um outro inventor rapidamente alterou para consumir gasolina –, até aos modelos mais recentes e complexos, a história das motas e as histórias da sua utilização disseminaram-se por todo o globo. E Lagos não foi excepção.
Entre outros entusiastas dessa irreverente forma de transporte, Francisco Parreira Cruz e a sua Harley Davidson de 1926, terão cruzado as ruas da nossa cidade, para espanto de alguns e admiração de outros, no início dos anos 40 do século XX.
Por volta de 1956, um grupo de amigos lacobrigenses fotografa-se nas imediações da Barragem de Silves, aonde se tinham deslocado em passeio de mota.

Da esquerda para a direita: José Paula Borba (proprietário da Triumph Tiger 100 - 500cc - modelo de 1951); José Henrique Martins; João Duarte Martins (proprietário da scooter Durkopp Diana - 200cc - modelo de 1954); Francisco Encarnação, carinhosamente apelidado “Chico Charrinho” (proprietário da BMW R25 - 250cc); Estêvão Bexiga (proprietário da scooter Durkopp Diana - 200cc - modelo de 1954); Augusto Gomes Marques, e José Pereira Ribeiro, em baixo. Foto registada por António Albino Botelho, que também integrava este grupo.
Mais recentemente, o espírito do motociclismo lacobrigense sofreu um impulso quando, em 1996, uma vintena de motociclistas se reuniu fundando o Moto Clube Lagos que rapidamente se expandiu ultrapassando a centena de membros. Já no dealbar do novo século outros núcleos e clubes de motociclismo surgiram, em Bensafrim e na Praia da Luz, alargando e potenciando a prossecução dos ideais e prática do motociclismo no município de Lagos.
É caso para desejar: Boas curvas!

 

Nota: A "Lei das 125" (Decreto-Lei 78/2009), permite aos condutores com mais de 25 anos e com carta de condução de ligeiros, conduzir motociclos com cilindrada até 125 centímetros cúbicos, e potência máxima de 15 cavalos (actualmente, estas viaturas estão isentas de pagamento nos novos parques de estacionamento de Lagos). Regra geral, comparativamente a um automóvel, uma moto consome menos combustível, exerce menos desgaste sobre as vias e contribui para maior fluidez do trânsito. Numa época em que as preocupações ambientais são assunto recorrente, aderir ao motociclismo é contribuir para uma menor pegada ecológica no que respeita ao transporte quotidiano.

3 comentários:

Anónimo disse...

Concordo consigo, é pena que é muito perigoso. Aqui no Brasil, onde vivo, as estatísticas sobre acidentes envolvendo motociclistas é alarmante e trágica.
Descobri seu blog e gostaria de parabenizá-lo pelas reflexões pertinentes, além do humor e do bom texto. Saudações!
Rodrigo

Anónimo disse...

Ops! Desculpe o erro na concordância: "são alarmantes e trágicas"...

francisco disse...

Caro Rodrigo, agradeço as simpáticas palavras, e reconheço a perigosidade dos veículos de duas rodas, sobretudo porque neles não estamos envolvidos pela "armadura" que os automóveis oferecem. E como em Portugal - e parece que também no Brasil -, transformámos as estradas em campos de batalhas de uma guerra que não distingue entre soldados e civis, culpados e inocentes, compreendo a apreensão que as motas suscitam.
Resta-nos esperar que a educação das novas gerações e as dinâmicas da prevenção rodoviária transformem essa realidade.

Saúde.