O amansar da fera

 
Na última década a Europa perdeu terreno e competitividade nas relações comerciais internacionais. Coisa que deve assustar aqueles que se preocupam com as condições sóciais de uma Europa que sempre resolveu os problemas de contingência económica através dos conflitos armados. Mas numa Europa singular, pelo menos em teoria, e que aspira a tornar-se um bloco sólido e coeso em todas as vertentes, tal não é possível por representar uma luta, a todos os títulos, fratricida. Por isso se afigura necessário implementar uma nova ordem económica, com um novo paradigma laboral. Como se faz isso sem que os poderosos do capital percam os seus proveitos é a resposta que o clube de Bilderberg* terá encontrado e com a qual instruiu os governantes europeus. Não fosse o aluno português um autêntico paspalho provinciano que se deslumbrou com o brilho das lantejoulas e a excitação do poder, e teria continuado a protagonizar essa queda, programada, para o abismo económico e financeiro de onde se espera que ressuscite a Fénix, com energias retemperadas e capaz de competir com chineses e indianos, num mundo novo que se transforma a uma velocidade vertiginosa.
Mas o pateta, deslumbrado com o oiro dos palácios, irritou o eleitorado com as suas atitudes prepotentes, nomeadamente porque esquecia, com demasiada frequência, que essa certeza na inevitabilidade da queda em direcção ao fogo de cujas cinzas se renascerá, não é facto do conhecimento, e muito menos da aceitação, das massas.
E foi-se, deixando a outros a tarefa de emagrecer o Estado, reduzir salários, comprimir lucros, levando o país para a reforma drástica que se impõe, nessa perspectiva bilderberguiana.
Agora, veremos se as reformas seguem um padrão minimamente justo ou, como temo, um padrão mais concordante com a estratégia que formulei, e em que não se alteram muitas das situações arbitrárias que pululam pelo país.
Será que o novo Governo vai ser justo e cortar as despesas de organismos inúteis que só servem para sustentar parasitas: acabando com Institutos que duplicam os serviços de diversos ministérios; dissolvendo fundações que não são mais do que sanguessugas do erário público e dos contribuintes; extinguindo empresas públicas que nunca tiveram sustentabilidade económica; acabando com observatórios, autoridades, comissões, e entidades reguladoras que só servem para produzir propaganda e alimentar a aristocracia do regime; impedindo a acumulação de duplas e triplas pensões milionárias; reduzindo substancialmente o número de cargos políticos (deputados, câmaras municipais, juntas de freguesia); estabelecendo salários máximos impedindo-os de superar os salários de cargos idênticos auferidos em qualquer dos outros países da União; proibindo as autarquias de contratar espectáculos, promover excursões e suportar a maior fatia das despesas de existência das associações culturais recreativas e desportivas como se estas fossem clubes municipalizados; combatendo a subsídio dependência, quer no âmbito social, quer cultural, artístico e cívico (não se trata de eliminar os subsídios mas de eliminar aqueles que vivem/operam/criam exclusivamente à custa dos subsídios); e reduzindo os custos com a função pública, optimizando-a, reduzindo pessoal, e reajustando salários? Ou será que tomam o outro caminho, a solução asfixiante do aumento do IVA (quanto, comparativamente, já é o mais elevado da União), e de todas as  outras prestações contributivas e fiscais que, pelo seu peso excessivo, inviabilizam grande parte das actividades desenvolvidas pelas pequenas e médias empresas?
Mas, será que a fera se deixa amansar ou o consumismo viciante e o nível de conforto alcançado criaram uma fera irrefreável que continua a exigir a manutenção do seu padrão de vida, e, inevitavelmente, caminhamos para o confronto entre fera e domador?
E quem tem razão, a fera ou o domador?




*O Clube de Bilderberg é uma conferência anual não-oficial cuja participação é restrita a um número de 130 convidados, muitos dos quais são personalidades influentes no mundo empresarial, acadêmico, midiático ou político. Devido ao fato das discussões entre as personalidades públicas oficiais e líderes empresariais (além de outros) não serem registradas, estes encontros anuais são alvo de muitas críticas (por passar por cima do processo democrático de discussão de temas sociais aberta e publicamente). Da Wikipédia

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