A minha experiência com
ciclomotores e motociclos é simples e rápida de contar. Começou aos 12 anos de
idade, com uma Casal de 4 velocidades que era do meu pai. Corria o ano da
revolução, 1974, e as voltas com a motorizada circunscreviam-se ao perímetro da
fábrica de conservas onde o meu pai trabalhava e à oficina/fundição de chumbo,
em espaço adjacente, que ele explorava em actividade pós-laboral. Lembro-me de
escorregar duas ou três vezes na calçada gordurosa do acesso à fábrica - devido
aos restos de sardinha que escorriam das camionetas e do sistema sem-fim de
drenagem da fábrica -, e ir “depositar” suavemente, a velha Casal, no chão de paralelepípedos
luzidios e gastos pelo uso.
Poucos anos depois enfileirava com
amigos na desmontagem e remontagem com alterações, de velhas máquinas como o
JLO 50cc, que ficava apto a trepar as arribas inclinadas das praias da zona; e andar
às voltas com a mecânica de um velho SACHS andorinha, tentando fazer daquilo
uma máquina de competição.
Depois das experiências com uma
scooter CARINA (125 ou 150 cc?), e uma Florette 50cc, e de
experimentar um SACHS V5, mais tarde, já com carta de mota, comprei uma BSA c10
de 1954. Tinha carburador AMAL que funcionava por gravidade, e quando se
inclinava muito a mota, o motor parava. Os meus amigos gracejavam dizendo que
não me podia deitar nas curvas, ou perdia a corrida. Quando a comprei, tinha a
embraiagem desmontada; o anterior proprietário tinha acabado de instalar as
cortiças nos discos mas não as tinha rectificado, nem montado. Tive de arranjar
os prismas triangulares em borracha - cortados de um pneu velho de tractor
agrícola -, e montei tudo; mas como as cortiças tinham ficado com espessuras
diferentes a mota perdia a embraiagem ao fim de uns cinco minutos de viagem. E
eu sem saber porque acontecia aquilo. Uma autêntica novela em duas rodas… sem mudanças.
Depois adquiri uma Virago 250 que
achei demasiado parecida a uma 50cc, com as mesmas vibrações da velha Casal do
meu pai, nomeadamente provenientes do cabo de travão da roda dianteira, portanto
rapidamente troquei por uma DNEPR MT81 com side-car tracionado e marcha atrás.
Afinar a folga das válvulas daquilo era uma epopeia pois a máquina nada tinha
que se pudesse considerar de precisão: cada porca das válvulas tinha a sua
medida e alguns parafusos do quadro nem tinham cabeça, senão uma certa redução
da forma cilíndrica, por martelamento, suficiente para dar uso a uma chave de
bocas. A folga das válvulas devia ser de 0,07 mas o motor trabalhava à mesma
com 4 ou 5 vezes maior abertura de folga.
Um dia fiquei sem a embraiagem -
por ter saltado o perno da haste recuperadora -; mas como a mota tinha dois
sistemas de comando da embraiagem, manete e pedal, lá consegui chegar a casa
usando o pedal num irritante pára/arranca. Valeu-me o representante da Marca, a
Moto Formosa, do Porto, que prontamente reparou o problema na caixa de
velocidades, oferecendo ainda um sinobloco para a transmissão, que era por
veio, uma câmara-de-ar suplente (já que eu não encontrava por cá uma câmara de
ar de ceifeira agrícola, supostamente igual), e ainda um conjunto de raios
(pois havia partido um recentemente numa das minhas deslocações locais), tudo a
custo zero.
Havia ainda outro problema
frequente: a alteração da sensibilidade da direcção devido à suspensão de braço
oscilante exigir a correcta lubrificação, por grafite, da caixa de direcção,
situação que eu alterara inadvertidamente com lavagens sob pressão. Mas era
maravilhosa a reacção dos entusiastas daquelas réplicas da BMW do tempo da II
Guerra Mundial, particularmente as crianças, como a minha filha que aos 6/7
anos adorava viajar no side-car, nem que fosse em pequenas viagens como quando
a ia levar ou buscar à escola.
No fim, era uma mota engraçada
que suscitava muita admiração nas concentrações de motas, mas gastava 11L aos
100Km, não passava dos 110 Km/h e tinha o inconveniente dos side-cars, ficar
engarrafada no trânsito automóvel, pelo que a vendi, ficando apenas com a
Virago 535 que já tinha adquirido há algum tempo.
Com a Virago fiz as mais
interessantes viagens pelo Algarve e parte do Alentejo, só repetidas com a
última e actual montada, a Honda Deauville 650. Entre as duas ainda tive uma última
50cc, uma scooter Yamaha BMX, que proporcionou alguns passeios rápidos a
objectivos de Fotografia para além de grande mobilidade e versatilidade no
trânsito citadino do quotidiano.
E é esta a minha memória de
experiências em duas ou três rodas com motor.
Francisco Castelo
Mar.2017
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