A peste que veio para ficar

 

«… somos homens de meia-idade e podemos fazer um apelo à paz, mas se os jovens não o fizerem também, o nosso apelo não tem a mesma força nem o mesmo impacto…» Dizia há minutos o convidado de Paulo Guerra no programa Império dos Sentidos (Antena 2) a propósito dos 75 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos 200 anos do Hino à Alegria, composto por Beethoven em 1823, e adoptado em 1972 como hino do Conselho da Europa, sendo hoje o hino da União Europeia.

E parece-me muito acertada esta perspectiva que coloca os jovens como protagonistas imprescindíveis nos teatros da epopeia humana sobretudo no que concerne à projecção das expectativas sobre o futuro da humanidade. Defendo que eles devem ser envolvidos nas discussões e confrontados com todas as perspectivas equacionáveis para cada problema.

Mas, sem que se observe esta condição prévia acredito que se colocará sempre uma velha e recorrente questão que acompanha a humanidade desde os seus primórdios e que consiste num conjunto de factores envolvendo: 1- o imperativo da experiência acumulada para reconhecer as diferentes perspectivas de cada problema; 2- a serenidade na reflexão para identificar correctamente os problemas e adoptar as soluções mais acertadas; 3- o reconhecimento do primado da Razão sobre as paixões, os dogmas e as ideologias, sob pena de se voltar aos erros cometidos no passado.

Ora, os jovens, pela sua inexperiência, pela sua condição natural de quem ainda está a aprender, não são os melhores portadores destas qualidades. E por isso é frequente atirarem ao lado e falharem o alvo, cegos por uma qualquer luz ofuscante que lhes é oferecida como verdade.
A seringa de “sangue” pendurada ao pescoço da estátua do D. Sebastião não é um acto gratuito de vandalismo mas uma manifestação gizada de protesto contra coisa histórica relativa aos feitos de antanho dos portugueses.

Tal como as massas tolas que papagueiam e arengam nas redes sociais apenas para gritar “Eu existo e tenho opinião!” estes protestos que dificilmente possuem um fundamento racional, granjeiam, no entanto, aos jovens militantes a aprovação e o reconhecimento do clã. Aspecto que sempre foi muito valorizado por todas as sociedades ao longo da História.

Triste idiotice, esta, que supostamente pretende mudar a geração actual fazendo julgamentos sobre a actuação de cinco ou dez gerações anteriores, como se a sociedade não tivesse dado conta de que o Mundo evoluiu desde então, como se ela própria não tivesse sido impulsionada para a renovação independentemente da habitual resistência à mudança, natural de uma geração para a seguinte. E esse lastro que deve ser vencido, permitindo estimular as novas gerações a progredir, sempre se verificou entre gerações mais próximas e sempre suscitou a rebeldia salutar das juventudes.

Mas não é isso que se verifica hoje, quando uma pueril Inquisição pretende atirar à fogueira as realizações do passado e condená-las ao esquecimento. Uma pestilência mental, abjecta e insana.

«O passado é indispensável
Embora o passado seja algo de terminado, há duas razões que o tornam indispensável para compreendermos o que estamos a vivenciar e o que nos espera amanhã e depois. A primeira é que a população mundial é aproximadamente 7% de todos os seres humanos que já viveram. Por outras palavras, há mais mortos do que vivos, catorze para um, e é perigoso ignorarmos a experiencia acumulada de uma maioria tão grande da humanidade. Segundo, o passado é a nossa única fonte de conhecimento verdadeiramente fiável sobre o presente fugaz e sobre os múltiplos futuros que temos pela frente, dos quais somente um se concretizará.»
Niall Ferguson, Civilização - O Ocidente e os Outros

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