O SOCIALISMO PEDINTE

"A imagem do PM António Costa com o PM holandês, Mark Rutte, há umas semanas em Haia vale mais do que mil palavras. Rutte faz uma vénia leve com a cabeça, o novo tratamento dos tempos do Covid. Costa está dobrado, simbolizando, com aquele gesto, a dependência absoluta do regime socialista em relação ao dinheiro europeu. Aquela é a fotografia do socialismo pedinte que nos governa.

Em Portugal, os dirigentes socialistas falam com voz grossa contra os holandeses e contra Orban. Mas quando toca a receber dinheiro da Europa, tudo se faz e tudo se esquece para receber os fundos e o capital que o regime socialista precisa para sobreviver, fazer negócios e reforçar o seu poder em Portugal.

A economia portuguesa enfrenta dois problemas muito complicados (estão ligados): falta de capital para investir e uma dívida (pública e privada) brutal. É um país sem capital e endividado até ao pescoço. O Banco Central Europeu é absolutamente crucial para gerir a dívida. Sem BCE e sem Euro, Portugal estaria falido. Em relação ao capital, durante uns anos, os dinheiros chinês e angolano disfarçaram a realidade. Mas, por razões diferentes, já não podemos contar com investimento chinês e angolano. A maior fonte de capital, dos últimos 35 anos, Bruxelas, torna-se ainda mais indispensável. A economia portuguesa não sobrevivia sem a União Europeia. E no partido socialista, todos sabem isso. As irritações de Costa com os holandeses e os desabafos de Pedro Nuno dos Santos contra Merkel são absolutamente irrelevantes.

Muitos em Portugal celebraram o último Conselho Europeu com um “momento histórico” para a Europa. Terá sido. Mas também foi um momento do maior “fracasso histórico” do regime português desde o 25 de Abril: aproveitar a integração europeia para fortalecer a nossa economia e construir uma sociedade próspera. Três décadas e meia depois, e muitos mil milhões de euros oferecidos por Bruxelas, temos uma economia fraca e vivemos numa sociedade remediada. Tal como em 1985, em 2020, continuamos na cauda da Europa e a pedinchar dinheiro. Eis, a maior vergonha da história portuguesa dos últimos 35 anos.

Muitos socialistas também pedem à União Europeia para ser uma verdadeira “união de transferências” (de dinheiro, bem entendido). Ainda mais? Desde 1985, Portugal recebeu de Bruxelas mais de cem mil milhões de Euros a fundo perdido. Quando o país ficou insolvente, em 2011, a União Europeia emprestou mais cerca de 50 mil milhões de Euros (o resto foi o FMI) para a economia nacional sobreviver. Se isto não é uma União de transferências, o que é? Agora os responsáveis socialistas garantem que se vai “usar bem o dinheiro que aí vem.” Pergunto: alguém acredita que um governo socialista sabe gastar bem dinheiro? Ninguém acredita. Não acreditam os holandeses, não acreditam os portugueses e não acreditam os ministros do nosso governo. Como mostra a realidade desde 1995, os governos socialistas sabem desperdiçar recursos, não sabem investir.

Só há uma maneira de os fundos que aí vêm não serem inteiramente desperdiçados, tal como sabem os holandeses e os alemães: uma fiscalização por parte da União Europeia. Ainda não é claro nem certo, mas tudo aponta para que a Comissão Europeia e o Conselho controlem a utilização dos empréstimos e dos fundos oferecidos. Nesse sentido, as decisões do Conselho Europeu indicam o fim da “união de transferências” e o início de uma união económica e financeira. Haverá mais fundos e dívida comum europeia, mas os pais mais dependentes, como o nosso, vão perder soberania e poder. Cada vez haverá mais decisões tomadas em Bruxelas e menos em Lisboa.

Tudo isto é trágico: a dependência total da União Europeia e a absoluta falta de confiança no governo para investir os fundos da melhor maneira. Desde 1985, Portugal teve tudo para ser um país com uma economia forte, uma sociedade próspera e independente politicamente. O objectivo dos fundos europeus é enriquecer para ser mais independente. O nosso regime político, do passado, recebeu independência, e ao futuro deveria deixar prosperidade. Mas falhou. Continuamos pobres, cada vez mais dependentes de Bruxelas, e deixamos um monte de dívidas para o futuro. Nunca tão poucas gerações traíram tanto muitas outras gerações. As que já morreram, e as que estão por nascer. Como foi possível isto acontecer?"

João Marques de Almeida In OBSERVADOR, 26 Jul. 2020


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